domingo, 26 de abril de 2009

Ensaio sobre emplasto

Graco escreveu parte de sua história como artista no teatro, mas sempre teve paixão pela dança o que nada impede de um ator também ser bailarino ou coreógrafo. Porém ainda existem narizes que se torcem quando alguém como ele ousa e faz pesquisa e leva para cena um trabalho de dança. O que normalmente se perguntam, mas ele sabe dançar, ele fez dança onde? Realmente Graco não possui uma formação acadêmica em dança, mas sempre buscou dentro dos limites em que foi possível adentrar nesse universo. Tanto que arriscou com o curso do extinto colégio de dança do Ceará para coreógrafo, que no meu ver dentre as inúmeras dificuldades físicas que ele encontrou no seu caminho, se saiu muito bem. Fez a escolinha de ballet para homens com o melhor mestre que alguém poderia desejar Flávio Sampaio. Acho que a passagem de Graco pelo colégio de dança fez com que ele não deixasse nunca de acreditar que um ator também pode produzir excelentes idéias como bailarino. Esse tabu talvez tenha se rompido quando ele foi agraciado pelo prêmio do Rumos dança do Itaú Cultural de 2006/2007. Recentemente Graco investiu em outro solo que ele deu o nome de Emplasto, nome bem interessante e que logo nos faz refletir sobre a saúde estética do nosso corpo, segundo as cenas investidas por ele utilizando uma fita adesiva para construir um corpo “ideal”. Cada vez que ele modifica uma parte do seu corpo e faz uma seqüência de movimento que é coreograficamente a mesma para todas as cenas, na verdade pela mudança na estética do corpo a seqüência de movimento acaba sempre diferente, pois o corpo nunca se apresenta igual. É possível perceber que esse trabalho sofreu certa influência nas pesquisas que ele realizou no seu solo anterior magno_pyrol em se tratando da questão da obsessão. Embora o trabalho esteja bem amarrado dentro de uma proposta de obsessão pela estética, alguns objetos cênicos poderiam ser retirados, ou melhor, trabalhados para que o ambiente a que todas as cenas se desenvolvem não se torne bagunçado, o que faz com que o público possa vir a pensar que a proposta também seja bagunçada, quando sabemos que não é. O que sugiro é dar um ar mais clean para o ambiente onde estão os objetos cênicos. Talvez também fosse interessante ampliar mais a movimentação e buscar atingir a perfeição na repetição do movimento, talvez pelo processo de exaustão sem precisar usar tantos objetos cênicos, isso se a idéia estiver dentro de um contexto de obsessão. O importante desse trabalho que ele não cai na monotonia, o que atualmente tem sido comum no cenário da dança em geral, pois se propor a desenvolver um trabalho solo precisa estar ciente dos riscos de se cair na mesmice e chatear seu público, o que não acontece nesse caso. Agora mãos a obra e continue trabalhando nele, pois só com a experiência você vai conseguir amadurecer e chegar em parte do que você acredita ser o ideal.

Entre salas atinge maturidade

O que dizer do espetáculo entre e saia para as entre salas?
Uma coisa é fato desde o dia de sua estréia, muita coisa mudou, e quando falo em mudança, praticamente é outro espetáculo. Porém vale ressaltar que a proposta de espetáculo-instalação e de poder ser apresentado dentro e fora da caixa preta permanecem firmes e fortes. A interatividade com o público se manteve de uma forma ainda mais ativa. Visto que para quem assistiu as primeiras versões apresentadas durante o ano de 2007 na temporada de junho, via um público que apenas entrava nas cenas finais e eram conduzidos pelos bailarinos a ocuparem os cômodos da casa e assistirem o resto do espetáculo de dentro da cena. Depois de muitas experiências hoje o público participa ativamente, entra desde o início, come pipoca, toma refrigerante sentado no sofá, e até experimenta uma refeição por vezes muito bem elaborada na companhia de uma das bailarinas, trocando idéias e conversando o tempo todo enquanto apreciam o prato que deixa muitos que ficam de fora com "água na boca". Além dessas mudanças evidentes ao longo de tantos meses em temporadas, o elenco foi totalmente renovado, algumas coreografias foram modificadas e melhoradas. Por isso sempre vale a pena asssitir, pois o coreógrafo tem mantido o hábito de nos surpreender com algo diferente em cada uma das apresentações do espetáculo. Embora ele mantenha a idéia fixa no contexto geral, como o cenário e a disposição das cenas, é um espetáculo que se mantém em constante mudança, por vezes quase imperceptível, por vezes totalmente ali presente. O grande barato de assistir esse espetáculo é que não existe uma monotomia, e mesmo que você já tenha assistido outras vezes, sempre vai existir algo no qual você deixou para trás.
É um espetáculo que tem um tempo de duração na medida, existe uma harmonia em cena visível as trocas de relações entre os personagens da casa. De todos os espetáculos até hoje produzidos pelo coreógrafo Edvan Monteiro, esse em especial foi o mais bem elaborado, o mais bem pesquisado em termos estéticos e técnicos e o mais surpreendente pela delicadeza nos detalhes e o cuidado com as trocas de cenas e a interação com o público. Porém se depois de tudo isso você ainda não assistiu, não perca tempo, acompanhe a programação da Cia aqui no blog e assista, pois vale muito a pena.

Ensaio crítico sobre Unwelt

Ao me deparar com o desafio de escrever uma crítica sobre o espetáculo Umwelt da Cia. Maguy Marin, por hora tive receio, pois acredito que escrever sobre o trabalho de alguém requer um certo cuidado e conhecimento do assunto. Confesso que o que sei sobre a obra de Maguy Marin é muito pouco, visto que assisti apenas a 2 espetáculos May B e Umwelt, dentro de 40 já coreografados por ela. O que torna difícil produzir um texto sobre o espetáculo, o jeito é adentrar no mundo da coreógrafa e buscar entender quais reflexões devemos fazer, do que exatamente ela esta falando? Sempre me faço uma pergunta dessas quando não conheço bem o contexto a que o trabalho esta inserido, o que o coreógrafo quer provocar em nós. Muito se ouviu falar das diversas vezes em que a coreógrafa Maguy Marin causou polêmica ao público francês. Há uma coleção de artigos jornalísticos e virtuais sobre o caos que ela causou em estréias de outros espetáculos. É bem verdade que o trabalho central de sua carreira fora o May B e que posso arriscar dizer que ele possui uma ligação direta com o Umwelt apresentado no encontro terceira margem em Fortaleza. No entanto ninguém pára e analisa sua trajetória histórica para entender um pouco de seus trabalhos. Maguy Marin vem de uma geração de coreógrafas que surgiu nos anos 80 com a explosão da dança contemporânea na França com um pequeno detalhe ela estava inserida numa tendência da nova dança francesa rica, e diversa em suas abordagens.
O que percebo que ela mexe fundo nas feridas da sociedade francesa, pois assume uma postura política muito forte. Ao ler um pouco mais sobre as indagações da coreógrafa e suas preocupações de como afeta os que a cercam, consegui entender um pouco do incômodo que seus trabalhos causam. Embora ela afirme que esse espetáculo teve um processo bem diferente dos demais, há uma preocupação latente em sua trajetória a questão da convivência.
Por horas enquanto assistia ao espetáculo e me surpreendia com tudo que saia de trás dos espelhos, percebi que ao longo das cenas que se repetia, alguma coisa havia ficado para trás, me perguntei se essas repetições eram mesmo para me fazer enxergar isso. As cutucadas sutis com cenas sobre violência, como a dos capacetes de guerra, o cuspir a comida e o chutar o bebê boneco. Percebi depois um ciclo de vida e de morte representados pelas repetições das cenas e que era exatamente ali que estava a resposta para minha pergunta. Ao ler mais sobre a coreógrafa passei a enxergar aquele momento de outra forma, não o de movimentos do cotidiano que costumamos fazer repetidas vezes e não nos percebemos fazendo, mas sim o que esses gestos representavam politicamente e filosoficamente para a sociedade pelo qual ela vive que muito pouco mudou, pois continuamos a repetir os mesmos erros.

Saiba um pouco mais

Natural da cidade de Santos/SP, formou-se em ballet clássico pela Academia de Ballet Valderez-1993. Cursou pedagogia na UNESP de Araraquara onde juntamente com outras alunas formaram um grupo de dança atuando como bailarina e professora de ballet clássico, apoiado pela instituição de ensino – 1998. Diretora, bailarina e fundadora da Cia Etra de dança contemporânea – 2001, participou de 4 edições da Bienal Internacional de dança do Ceará e 3 edições da Bienal Sesc de dança de Santos/SP. Ganhadora do prêmio de incentivo as artes com o espetáculo “De um a cinco”-2004 e “Entre e saia para as entre salas”-2006. Atualmente vem realizando pesquisas de movimento agregadas a fotografia e videodança, além de constar em sua trajetória como bailarina da Cia Etra de dança um total de 12 espetáculos de dança, 4 performances, 19 participações em Mostras, Festivais e Bienais Internacionais de Dança, 3 residências e ainda carrega consigo 10 prêmios entre destaques para coreografias e incentivos a montagens de espetáculos
 
©2008 Elke di Barros Por Templates e Acessorios